quinta-feira, julho 19, 2007

…4ª, 5ª e as curvas são contornadas perfeitamente sem esperar obstáculos no caminho. A música grita e os meus pés e mãos seguem o seu ritmo. E se largar o volante agora? Morte imediata. E depois? Centro-me na possível sensação de ser atirada contra uma parede a tal velocidade. Pisco os olhos. Tenho sono mas os meus sentidos estão inconscientemente aguçados. A noite. Sinto-me a ser sugada, qual buraco negro, para um caminho q não é o que preciso de tomar para chegar a casa. Mas onde fica realmente o sítio onde me sinto em casa? E o leve nevoeiro cobre o quarto crescente no horizonte e o palácio de luzes calmas. A sensação de liberdade é inevitável mas não total. Falta qualquer coisa… Tenho ainda uma corda por tirar. Com maior ou menor penar é para a liberdade que caminho. O ar quente e húmido da noite mostra-me uma praia escura de rochedos proeminentes e lendas antigas… O medo. O medo. E nego os meus instintos seguindo para o conforto da minha habitação. Inspiro fundo a magia da noite…

“E porque a noite nos atrai sempre e os nossos passos caminham sempre em direcção a ela (…)”

…e fujo, procurando uma cama para dormir ou um livro para me distrair em vez de enfrentar, no contexto apropriado, a possível realidade do futuro. A peça que faltava foi encontrada e no entanto o vazio do seu lugar mantém-se. Será possível agarrar a areia sem a fazer fugir por entre os dedos? Livre mas acorrentada pela dúvida num nó apertado pelo medo. Perder, perder… E a noite continua lá fora, a coruja pia e a vontade de correr para aquela praia mantém-se. Mas o sono também bateu à porta depois de um dia preenchido propositadamente por tudo quanto canse o corpo. Há coisas por fazer mas não importa. Fica o medo, a incerteza, a saudade e aquela liberdade que só a noite dá.

Quem será que canta esta música? Gosto.

terça-feira, julho 17, 2007

Preciso…

De pés descalços e unhas pintadas
De acordar sem sonhos e adormecer a meio de conversas
De ver pessoas novas e falar com desconhecidos
De sair sem casaco, ainda que esteja frio
De fotografar pegadas na praia e pessoas nas ruelas
De ouvir os gritos histéricos das gaivotas ao pôr-do-sol
De ser clandestina numa cidade diferente
De ver o sol nascer antes de voltar para casa…


Quero…

Comer torta de chocolate como pequeno-almoço
Sentir os ritmos das ruas e dançar como quem anda
Partilhar dias consecutivos com aqueles que me fazem sorrir
Deambular pela cozinha entre o calor e os aromas
Acordar alguém com gritos e flashes
Nadar nas límpidas e calmas águas, desejando que houvesse ondas
Ser a Ema de engenharia ambiental, por uma noite
Ver os artistas de rua e adivinhar o se esconde por detrás das máscaras…

Preciso de me sentir livre no mundo…
Quero voltar àquele tempo só nosso…

Saudades muitas.

"...e pintar com quantas cores o vento tem..."

domingo, julho 15, 2007

"A centopeia era feliz, e muito,
Até que um sapo, gozador,
Perguntou: "por favor, qual perna vai à frente?".
Isso confundiu-a tanto
que, distraida, afogou-se num tanque,
Atrapalhada, pensando em como andava."


(In, Steve de Shazer, terapia familiar breve)

sábado, julho 14, 2007

Gomas medievais e luas de madeira, ruas estreitas e escadarias cúmplices, poemas que voam e músicas que caem. A noite. E tropeço em ti a cada passo do meu caminho, entre o que foi e o que poderia ser, açúcar e ritmo em deambulações solitárias, como se a minha própria sombra tivesse partido. O paradoxo de prender os pés naquilo que não está, como se a complementaridade fosse prova de existência efectiva. E esta sensação de igual-para-igual faz com que tudo nasça naturalmente, permitindo ser plenamente sem quandos nem porquês até que outro sol nasça. Mas não agora, e corro para o sol da madrugada que cega o monstro que vive na minha barriga com a promessa de um dia cheio de tudo o que não seja teu. Promessas… Tu és tudo e já não consigo ser sem te ser a ti, tão intricada está a tua vida na minha. E recordar os momentos em que deixei de ter medo de mim e do mundo em lugares meus, embora já não exclusivos, onde posso ser, verdadeira e naturalmente, Eu. Percebo agora que esse Eu não me pertence e não se confina à minha essência. Também ela foi contaminada, expandindo-se muito para além dos meus limites físicos, sincrónicos e diacrónicos. Eu já não sou só eu, mas um conjunto de momentos, lugares e pessoas onde tu te passeias constantemente para me lembrares de quem sou. É um sentir-te aqui sem estares, como se fosse uma sombra que vemos mas não podemos tocar. E recordar-te Tu, absorvendo ambientes, partilhando olhares e canções, em lugares impregnados de qualquer coisa, entre um tu e um eu, que não sei descrever, num estado aparentemente presente e despreocupado, como se o amanhã não existisse e o resto do mundo fosse uma ilusão. “Uma pena azul?” …é possível…
A distância voluntariamente forçada dói com dúvida e saudade, mas mais ainda por separar a magia da realidade, quando estas se definem uma a partir da outra...


quarta-feira, julho 04, 2007


“É humano querer o que nos é preciso, e é humano desejar o que não nos é preciso mas é para nós desejável. O que é doença é desejar com igual intensidade o que é preciso e o que é desejável, e sofrer por não ser perfeito como se sofresse por não ter pão. O mal romântico é este: é querer a Lua como se houvesse maneira de a obter.

Não se pode comer o bolo ser o perder


Fernando Pessoa, Livro do Desassossego